Wednesday, December 28, 2005

A História dos Índios de Palmares


A "Aldeia de Palmares", segundo Leon Oranian

Essa história, Leon Oranian, 6 anos, me ditou,
para escrever, dentro do trem -espresso
quando voltávamos de Hannover à Berlin
no dia 27.12.2005


de: Leon Oranian

Era uma vez os índios de Palmares.
Esses índios tinham um Elefante de longos marfins.
E esse elefante era o Dono do Fogo.
Um dia um Cowboy com outros cowboys
queria matar todos dessa floresta de Palmares
dizendo que essa floresta era deles,
porque tinha um cristal muito imaginado
escondido nela;
e também que esse cristal podia mostrar
tudo o que acontecia na Vida.

O Cowboy tinha uma pistola-de-flechas
e queria matar o Grande Chefe de Palmares.
Mas o índio, com seu arco-e-flecha, atirou primeiro
E o elefante falou: "Os cowboys não podem
acertar em você porque você
tem um escudo protegido pelo fogo..."

Tuesday, December 20, 2005

As Lourinhas, a Rapaziada e DiElza Soares


Stop Nazi - Foto: Ras Adauto

Nego é o seguin, como diria o poeta Torquato Neto:
Bato com as maos de veludo nesse Atabaque. Ressoa aonde?
Como é que essa Banda toca? Toca em que Fm aí do Brasil?
Toca em que FMs do Mundo Globalizado?
O Neonazis hoje me olhou no metro com cara de cú.
Fiz caretas pra ele e mandei a merda.
No cú, pardoca neonazis!

Ontem The Wailers , a Banda de Bob Marley tocou no Loft
e fumamos skanks de plantacoes de uma rapaziada holandeza
que era um beleza.
Familyman como sempre nao disse uma palavra,
tocou o máximo e fumou todas.

Como é que essa banda toca?

Estava cheio o show e as lourinhas loucas como sempre
para darem pros Rastas e pros Blacks presentes.
The Wailers tocou todos os hits hinos conhecidos e músicas
que eu nunca tinha ouvido na minha vida. Como sempre clássicos.

As lourinhas queriam invadir o camarim da rapaziada depois do show, mas eram controladas pelos alemaes invocados da seguranca, ao mesmo tempo putos pois as lourinhas deles estavam doidas para arrebentarem qualquer Rasta que passasse pela frente. E segurancas daqueles, muitos deles sao Neonazistas enrustidos, e se pegam um Rasta de bobeira num canto qualquer de Berlin arrebentam com o cara, e ali tinham que protejer os Rastas das Lourinhas Lascívas e fumadas pra chuchu.

O skank era do bom mesmo!!! Nesse ponto temos que tirar o chapéu.
Eu estava lá de "reporter" e nao quis nenhuma lourinha daquelas, pois já estou de saco cheio dessa história.

E os caras sequestraram a minha fotográfica digital e nao pude registrar os acontecimentos, mesmo dizendo que eu era amigo do Familyman. Falei pro Familyman depois : "Po, Brother, prenderam meu aparato fotográfico lá na entrada". Familyman só disse; -"Yeah!" - e me passou o trolhao cheio de fumaca que inundava tudo na regiao.

Saí dali azuado depois, recuperei a minha digital fotográfica e ainda pude ver várias lourinhas impertinentes querendo arrombar as portas do camarim da Rapaziada. Na saída encontrei uma galera que ia nao sei pra onde, continuar o agito, me recusei ir junto: - "Ih, carioca, qualé, tu tá em Berlin, vamos nessa". Olhei em volta e tinham várias lourinhas daquelas chapadas juntas no bonde. Falei: "To fora desse bonde!!!!. Descolei um pouco de skank pra levar pra minha gata e me entoquei no primeiro metro que passou.....
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Di Elza

Quem pode pode
quem nao pode se sacode.
Elza, a Soares
pode e se sacode muito bem
Elza nao tem idade
Tem a idade da música prapular brasileira
Aonde estiver será Elza Soares
O Samba sincopado-coracao do Brasil
Elza nao deve nada a nenhuma cantora norte americana

Eu queria ver um dueto
entre Elza e Billie Holiday

- imperdível para a humanidade sonora...
nem Deus acreditaria
no que estaria ouvindo!!!!......

AQUIDABÃ


O Aquidaba


Olhei o Corcovado e o Pão de Açúcar
domingo a noite
de uma cantareira vindo de Niterói.
(Lia uma carta de Glauber Rocha na Folha de Sao Paulo
e dei-me risadinhas "sinistras"...

Enquanto cruzo os Arcos da Lapa
indo para Santa Tereza
continuei a ler o "Triste Fim de Policarpo Quaresma",
do Lima Barreto:

Rio de Janeiro, ano 1893 - Revolta da Armada.
Caudilho do hora: Marechal Floriano Peixoto
- o "Marechal de Ferro".

(Amanhã quero ver a Baia de Guanabara de outro ângulo
- com os olhos voltados para aqueles tempos das batalhas):

O navio AQUIDABÃ, tomado pela marujada rebotalha e revoltada,
bombardeou por vários dias seguidos
a Bela e Muy Leal Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro,
capital da República.

A maestrina e maxixeira Chiquinha Gonzaga
teve suas músicas censuradas como provocativas e libidinosas para a República
e só não foi presa por ser afilhada de Duque de Caxias
e foi trancafiada dentro de casa
suspeita de colaborar com os rebotalhos revoltados.

No teatro de variedades só resistiu à Guerra Civil
a peça-comédia "O Abacaxi"
descascada por um ator que imitava o Marechal de Ferro
com sua longa capa preta e sua espada sanguinária na mão
- seu contra-ordem era um temível capoeira.

Floriano Peixoto transformou as muralhas
do Mosteiro de São Bento
numa fortaleza de canhões e torpedos
que atiravam no Aquidabã fundeado
na Baia de Guanabara, que era dos Tamoyos...

No início da Revolta estavam ancorados na Bahia do Guanabara
vários navios de guerra estrangeiros como "observadores internacionais":
o cruzador francês o Arethuse,; três navios britânicos: o cruzador Sirius e as canhoneiras Beagle e Racer;
os cruzadores italianos Giovanni Bauzan e Dogali; e a corveta portuguesa Mindelo.
Juntaram-se a essa força internacional os cruzadores alemães Arkona e Alexandrina;
os cruzadores americanos Charleston, New York, San Francisco, Detroit e Newark,;o cruzador holandês De Huyter:
o cruzador italiano o Etna, as canhoneiras Andrea Provana e Sebastiano Veniaro,; cruzador francês o Magon ,
o cruzador britânico Barracouta, a fragata austríaca Zrimgyi e a corveta portuguesa a Afonso Albuquerque...

Aquidabã seria vitima de várias tentativas de bombardeios
e ataques das forcas legalistas do Marechal de Ferro.
Numa delas o cruzador inglês Sirius apreendeu uma lancha suspeita, chamada Joana,
ostentando a bandeira britânica tripulada por um americano, um canadense, um norueguês,
um belga, um irlandês e dois brasileiros, todos mercenários contratados pelo governo do Marechal Floriano Peixoto,
que levavam uma mina para ser presa ao casco do Aquidabã.

Nos fins de semanas
as famílias vinham assistir aos combates
das muradas do Cais do Passeio.
Traziam binóculos, sorvetes, rapé e faziam alegres pic-nics.

As buchas-de-canhões eram os "pés-rapados",
ex-escravos, mulatos desempregados,
brancos fuleiros, gentes dos subúrbios
e das cabeças de porco e das favelas ao redor
- a ralé da Capital
encravada no coração da República Nova...

Muitos foram fuzilados na Ilha do Boqueirão
e seus cadáveres lançados na Baia de Guanabara
dos porões dos navios rendidos pelo Marechal de Ferro.

Os comandantes da Revolta, todos graduados e brancos, foram aliviados.

Aquidabã foi bombardeado e destruido em Angla dos Reis.

O Major Policarpo Quaresma
patriota nacionalista de tempera tupy
- fervoroso admirador do Marechal de Ferro
é setenciado com traidor da pátria horrorosa
por discordar do banho de sangue e da chacina
no presídio da Ilha das Cobras pelas ordens supremas de Floriano Peixoto.

O Major Policarpo Quaresma foi passado a fogo e ferro
numa noite de calabouços e agonias
e seu corpo jogado aos peixes da Baia de Guabanara
que assistia a todo aquele horror tingindo suas águas.

No meu primário, nas aulas de História do Brasil,
o Marechal Floriano Peixoto
era conhecido como "Floriano Pescoço"...

Aquidabã quer dizer "terras entre rios, ilhas, terras férteis e aguadas"...

(Referencias mínimas:
- "Triste Fim de Policarpo Quaresma", Lima Barreto, Edicao Online
- O Encouracado Aquidaba, Paulo de Oliveira Ribeiro, Revista Naval)

Monday, December 19, 2005

Batucada em Berlin


É plantando que a gente se entende!

Até agora nada demais
nessa minha vida acanalhada
sou um personagem alegre
do meu próprio drama

no portao de brandenburg
neonazis me olham com raiva e nojo
e eu sigo com a minha banda de teimoso
tocando um samba rasgado que fiz pra berlin

no metro para kreuzberg
a velha senhora tem cara de panico
e é branca como um cadáver
deve imaginar que eu sou um
perigo terrorista para toda
a sua deutschland querida
perdida de seu antigo traüm (sonho)
e invadida por ousados negros auslanders

por aqui agora tudo é digital
até a vida a poesia e a morte
sao digitais agora
entao eu sou um botocudo digitalizado
em plena europa do século XXI

me de um beijo meu amor
que o bus para alexanderplatz
chegará em 5 minutos
nao se esqueca de cuidar bem
de nosso filho - a jóia melhor de nós

logo mais eu volto e trago flores
vinhos bombons magazines
e algumas histórias engracadas
e poemas safados escritos
em alguma língua estrangeira

e passo a passo passo
cantando meu samba rasgado
um samba rasgado em berlin
para essa sua gente que ri
com os dentes travados
e rugas eternas na testa...
.....................

Cabecas Cortadas





Ao Cineasta baiano Glauber Rocha


Quantas cabecas cortadas
fazem um país como o nosso?

- Foram tantas cabecas
que eu nao sei contar!...

O Arrastao


Um dos nossos repórteres tomando um solzinho num Piscinão da Galera. © Ferrare

Ubaporu Presse Agentur, Berlin





Guiados pelos últimos acontecimentos na Cidade do Rio de Janeiro, mandamos uma equipe de correspondentes para uma série de reportagens sobre o Arrastão , uma modalidade de celebracções comunitárias que ocorrem naquela cidade maravilhosa durante as entradas do verão, que já está ficando famosas no mundo inteiro.

Logo na entrada, depois de deixar o Aeroporto Internacional Tom Jobim em um micro-onibus da Agência 171 Tour, nossos repórteres foram depenados em plena Linha Vermelha, por um entusiasmado comitê de recepções da Favela do João. Conseguindo escapar dessa com vida, e completamente emocionados com a gentileza e a simpatia da rapaziada, que ainda cantaram um pagode esperto antes de soltá-los apenas com as roupas do corpo, chegaram ao Hotel, onde ficariam hospedados durante a estadia.

Depois dos descansos necessarários da longa viagem, nossos correspondentes foram conhecer de perto a cidade, guiados por agentes de turismos, devidamente credenciados. Participaram do corre-corre de um tiroteio em plena Vieira Souto em Ipanema, entrevistaram menores depenando gringos em Copacabana; subiram o Buraco Quente da Mangueira para atestarem a qualidade do pó; visitaram os depósitos de armas anti-área do morro da Mineira e acompanharam um bonde-blitz que fechou o Tunel Santa Bárbara por quase duas horas.

A repórter Brigtti Meckler, extasiada, não parava de falar:

- Wundebar! Wundebar! (Que maravilha!!! Que maravilha!!!)

Depois de muitos contatos, presenciando e escapando de uma série de arrastões e achaques policiais em vários pontos da cidade, nossa equipe encontrou-se com Dona Maria Mete-Bronca do Morro do Quebra Tudo, considerada a maior arrasteira da cidade. O encontro se deu em seu reduto, na rua 3 daquela comunidade.

- Dona Maria, ficamos sabendo que a senhora é a arrasteira mais famosa por aqui, como é que é isso?

- É verdade, meus filhos, estou nisso há vários anos. Já ganhei até troféus e tudo e já apareci até na Globo. Outro dia mesmo veio me visitar uma equipe de televisão japonesa para me entrevistar. Mas na entrada, o arrastão de minha concorrente, a Penha Carro-12, deu uma geral nos japa, aí já viu, né? Também já recebi um pessoal lá de Bagdá, veio aqui para uma consulta...e estudar um pouco da nossa tecnologia...

- É verdade que a senhora está juntando comprovantes para sua entrada no Guinness, como a arrastadeira que mais fez arrastão?

- É verdade, meus filhos, mas a Penha Carro-12, com invenja, também diz que ela merece estar no Guinness. Vamos ver, né?

- Muito obrigado, Dona Maria!!!

- Muito obrigado voces. E cuidado ao sairem daqui, pois olhei pela janela e vi uma galera se juntando na esquina, esperando voces sairem...

Depois de conseguir furar o bloqueio do Quebra Tudo, nossa equipe, ainda com hematomas pelo corpo todo, seguiu até a zona sul da cidade onde estava rolando uma festa chick movida a Funk, uma modalidade de música banida das favelas e adotada entusiasticamente pela alta-burguesia do Rio, para a entrevista com uma socielite famosa: A princesa Pomba-Rolou de Orleans e Bragança.

Na Pista iluminada e enfumaçada da Disco, balançando a bunda e as jóias (carésimmasss, um luxo!!), na dança da cachorra, a princesa berrava: "Amor, queria que você/ tivesse o cabelo bom para não passar henê." E: "Estou toda atoladinha, estou toda atoladinha." Depois comentou para a nossa Reporter Briggti Meckler:

"Amo funk. Nunca fui a nenhum baile porque tenho um pouco de medo, sei lá sou lourona...", explicava Pomba-Rolou, suada. A princesa, que bateu bundinha como qualquer funqueira, também gostou muito da música "É que eu moro na estrada da Posseeeeee".

Perguntada sobre o Arrastão, respondeu:

- É meu sonho de consumo, participar de um Grande Arrastão. Iria ser a glóriiiaaaa, imaginem: eu lá no meio daquela fofoca toda, que loucura!!! Mas sei lá, sou lourona e a galera ainda não está acostumada com louronas em Arrastão... Mas precisamos é educar a galera para eles ficarem sabendo que nós também somos gente e queremos participar, contribuir, sei lá, o básico: ser igual a todo mundo, sem essa de preconceitos, sei lá!

Depois saiu rapidamente escoltada por vinte seguranças fortemente armados e entrou em sua lumosine blindada e ainda gritou em ritmo de funk para a nossa reporter, enquanto saia em disparada:

- "Desce! Perdeu! Abre a porta, f.p. ! Passa a bolsa, passa tudo!"

No dia seguinte, depois de uma maratona de telefonemas, nossa equipe conseguiu uma rápida entrevista com o Secretário de In- Seguranca interino do Estado, Delegado Alvo do Lins Nao é Nada Disso. Escondido em seu bunker, na Secretaria de Inseguranca. no Centro da Cidade, Dr. Alvo está indignado com um relatório de uma Ong de Direitos Humanos que relatava a violencia na Capital e de seus quadros policias:

- Isso é um absurdo. Nossa capital é um dos lugares mais seguros do mundo. Eu, por exemplo, nunca vi um assalto na minha vida. Só fico lendo e vendo isso pelos jornais e na televisão. É coisa de política, do PT. Os senhores estão vendo algum assalto aqui, agora?!!! Por outro lado, a nossa polícia é uma polícia inglesa, só tem gentlemen. Nem o Bush tem uma polícia como a nossa, altamente técnica, competente, cienctttíiiificcaa... Nossa polícia é a que mais contribui para os Direitos Humanos no país...


- E os Arratões, Dr. Alvo ?

- Sao fatos isolados, nao tem nada a ver com seguranca pública... São festejos das comunidades carentes, que nós temos que respeitar... Estamos numa democracia e temos que respeitar as diferenças... As vezes acontecem uns excessos, gente que cheira de mais, perde a linha e quer bagunçar a cidade. Aí, temos que interagir, conter os excessos. Mas o que estamos notando é que os Arrastões estao muito bem organizados. Incluisve estamos sugerindo ao nosso Secretário de Cultura e à nossa Governadora, para que no ano que vem se promova um concurso sobre o Arrastão mais bonito, mais organizado. E o mais votado receberia o Troféu Arrastão de Ouro do ano, entregue pela nossa Secretaria, com uma grande Festa no Teatro Municipal com a presença de vips e apresentação do grupo de Pagode das nossas Forças Especiais "Matamos Mas Não Acontece Nada"... Precisamos interagir com a Comunidade carente...

Na manhã seguinte, nossos reporteres foram até a Urca, participar de um evento do Viva o Rio e Salve-se Quem Puder, numa corrente de orações pela Paz na Cidade. De frente ao famoso morro do Pão de Açúcar, todos vestidos de branco e carregando velas acesas, cerca de mil manifestantes faziam a seguinte novena:

"No Pão de açúcar
de cada dia
Dai-nos Senhor
A Poesia de Cada Dia

No Pão de Açúcar
De cada dia
Livrai-nos Senhora
Dos Arrastões de Cada Dia..."

Estavam todos em concentração, quando se começou a ouvir estouros de rojões e batuques. e a gritaria de uma galera correndo desbalada em direção aos manifestantes. O que parecia ser o líder da novena, gritou para os manifestantes da Paz:

- Corram, que lá vem o Arrastão de Madureira, aí gente!!!!

Antes de deixar o Rio de Janeiro, nossa equipe soube, através de informantes, que o Ministro da Cultura Gilvelho Gil, estuda a possibilidade de estabelecer o Arrastão carioca como um Ponto de Cultura e seu possível tombamento como Patrimonio Cultural da cidade. O Projeto, segundo, as fontes, tem a simpatia do Presidente da República. Mas está esbarrando na rabujice do Casal Garotinho, que alega que "o Arrastão é Coisa Nossa" e não abrem mão dele para a governo federal, mas que aceitaria as verbas do Projeto para incrementar a sede da Federação dos Arrastões do Rio de Janeiro, "obra prioritária" de seu desgoverno de um real. Consultado, o Prefeito Cesar Mala, disse, em mais um factóide, que o Arrastão começou em seu governo e que tanto o governo federal e estadual estão se apropriando de uma obra de arte sua., de sua lavra.

Nossos repórteres deixaram a cidade na manhã de ontem, com duas baixas: dois de nossos correspondentes haviam sofrido um sequestro na porta da Boate Help, em Copacabana e até o embarque da equipe não haviam dado sinal de vida e nem a polícia, comunicada, sabia por onde começar a resolver o misterioso desaparecimento dos jornalistas. Será que foram pegos por um Arrastão?


Ras Adauto, Chefe de Redação
Ubaporu Presse Berlin
29-10-2004

A Lenda da Virgem Santa que gostava de dar beijos na boca



O Boto Tucuxi


Maria Imaculada, a Virgem Santa
Tinha um único vício:
Gostava de dar beijos na boca
De todo mundo que encontrava.

Seus beijos deixavam uma marca de mordida
Na boca de quem Maria beijava
E quando lhe perguntavam porque
Deixava aquela ferida na boca de alguém,
A virgen Imaculada respondia:
- É o signo eterno do meu amor!

Um dia Maria foi viajar numa terra distante
Ao sul, nos trópicos.
Ali beijou todas as bocas que pode
E espalhou sua marca de amor
Por toda aquela gente,
diferente da sua gente na Palestina...

Uma noite de lua cheia
A Virgem Santa passeava à beira do grande Rio
e se deslumbrava com a imagem da lua
Que flutuava nas águas desse rio,
que nao era o Jordan…

Um belo rapaz moreno
de cabelos negros compridos de seda
E todo vestido de branco
De repente veio ter até ela.

Maria chegou-se até ao rapaz
E beijou-o longamente na boca.
Mas seu corpo grudou no corpo do estranho
E seus lábios também ficaram feridos
De uma mordida.
Foi a primeira vez que a Santa Imaculada
Se assustou com um beijo de alguém...

Sete dias depois lhe apareceu
O Anjo da Anunciacao, com suas
Asas de diamantes e tiaras de ouro nos cabelos
Chegou-se até à beira de sua cama
E falou com voz de flauta doce:
- Maria, voce está plena e daqui a nove meses
nascerá de ti Aquele que Será!

E o Anjo afastou-se em direcao à porta

Do lado de fora, encostado na cerca da tapera
Encontrou outro anjo, o Ismael do Deserto
Que perguntou ao Anjo da Anunciacao.

- Quem emprenhou a Santa?

O Anjo da Anunciacao olhou para um lado
Olhou para o outro
e respondeu entre dentes:

- Foi o Boto-Tucuxi!...

"O Branco e o Índio"


A Poeta Elisa Lucinda e Ras Adauto, no filme
"O RIO", de Marcelo Serra



O índio Sebastiao de Oxossi Tupinambá
Foto: Katharina la Henges

"Aicué curí uiocó, paraná-assú sui, peruaiana, quirimbaua piri pessuí
[Vai aparecer do rio maior, o maior e mais poderoso inimigo de vocês].
Foi com essa mensagem que Ponaminari, o grande mensageiro de Tupana, tentou prevenir todos os povos que dominavam estas terras antes de 1500.
Talvez os pajés e os chefes imaginassem que este poderoso inimigo fosse uma epidemia, ou a ira dos ventos, revolta das matas, ou mesmo vingança de Curupira.
Mas em nenhum momento eles imaginaram que o inimigo seria o homem branco, vindo do meio do mar, conforme testemunharam os olhares Tupiniquim, Tupinambá e quem sabe outros povos nativos da costa Atlântica.
Muitos anos depois, essa mesma história se repetiria nas terras dos valentes Xavante, Kaiapó, Juruna e Kayabi no Centro-Oeste, entre os Tarumã, Baré e Manao, na confluência dos rios Negro e Solimões, e entre os Tukano, Baniwa, Desana e outros no extremo norte, no alto rio Negro."

Baré Braz de Oliveira Franca - Rio Negro

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A epopéia indígena segundo Ras Adauto

Ele vieram das imensas águas em grandes pássaros de vento
Muito brancos e barbudos,
tinham armas que cospiam fogo
e ferros que cortavam as carnes e as árvores.
Também trouxeram os Paí
com imensas cruzes e rosários
e nos benziam dizendo
que éramos filhos de um Deus
que a gente nem sabia o que era.

Dormiram com as nossas mulheres
tomaram as nossas terras
incendiaram nossas aldeias
escravizaram nossos parentes
mataram as nossas criancas
e disseram que ali era tudo deles:
tudo Portugal e de El-Rey
que a gente nem sabia o que era...
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O TUPINAMBÁ


"Ali vem a nossa comida pulando" -
Oswald de Andrade, Poesia Pau Brasil


Veio um sordado barbudo
Coberto de armaduras
lancas brilhantes e estandartes
que era uma beleza!
- aí, a gente comemos ele!…

Veio um Donatário
Todo emproado
Cheio de medalhas e honrarias
E uma imensa capa de veludo vermelho
- aí, a gente comemos ele!…

Veio um padre
Com uma enorme cruz
E quis botar a mao
Nas nossas cabecas
- aí, a gente comemos ele!…

Veio uma esquadra
Maior que um maloca
Com armas poderosas
Cuspindo fogo como um trovao
- aí, a gente corremos mato adentro!…
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Aí a gente dormiu
Só Cunhambepe ficou acordado naquela noite
E Cunhambepe nao era de ficar alerta atoa
Quando eles vieram em suas canoas ligeiras
e tentaram aportar em Urucu-mirim
Cunhambepe deu o alerta
Aí nos respondemos ao fogo cruzado
Com as nossas flechas relampagos
e a Baia de Guanabara ficou tinta de sangue
naquele dia
E Cunhambepe nao era de ficar nervoso atoa...
=========================================

Ói, Parente
É vem a nosso comida ali pulando
Deve dar um moquém delicioso
Pra gente comer com beijú e Caium

Depois vamos brincar com as Cunhas
na redes de fazer mais curumins e cunhantas
e povoar tudo de novo por aqui...
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Aí o Paí levantando a imensa cruz
mandou que todos nós nos ajoelhassemos
Jaguareque nao se ajoelhou
E o Paí falou que Jaguareque era o Demonio...
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Ajuricaba virava tudo que era bicho na mata
Eles custaram a matar Ajuricaba
Quando Ajuricaba foi morto
Virou assombracao para assombrar a Vila deles
Ajuricaba assobiava no vento
Virava raio e trovoes e insetos venenosos
Virou anaconda e comeu muito deles
Eles nunca mais esqueceram Ajuricaba
que habitou até os sonhos deles...
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500 Anos depois:

- E aí, Índio?!
- Índio, nao!!... Caboclo!!!
Tenha mais respeito comigo...

- E aí, Bugre?!
- Bugre, nao!!!... ÍNDIO!!!
Tenha mais respeito comigo...

Friday, December 16, 2005

MEUS CORACOES


Luciana, a dancarina da Academia Tangará, Berlin 2005


Nao sei quantos coracoes tenho
ou se tenho coracao ou um mundo inteiro dentro de mim
as vezes pulsa como um tambor frenético
querendo falar com todos
principalmente com as mulheres que passam
outras tantas como uma surdina palavra
que se surrurra num canto para alguém muito especial
outras fala comigo mesmo como se eu fosse seu outro
ou seu próprio coracao que bate
e me confunde com uma certa euforia
em querer andar de metro na cidade
ou correr pelos campos como um cavalo alado
que só eu sei que existe
ou como um indio numa floresta inteira

Quando durmo vigia com meu anjo da guarda
os meus sonhos mais loucos e livres
e pensa em amar a todas elas que se atravessam
e bailam nos intertícios das sombras e das luzes
e recita com meu anjo da guarda
um longo poema maroto para a minha própria anima
que com eles colhem o mel e o néctar
que existe nesse mundo do impossível...

Nao sei quantos coracoes tenho
Mas sei que eles me fazem assim
- música permanente e pulsante no que posso ser
música que vibra e danca, humana e amorosa...

Berlineß 1993


Britta e seu violino, tristes - 2005

O músico brasileiro Ibere
se enforca no apartamento do amigo alemao
em plena sexta-feira ensolarada de Berlin.

O artista plástico Ivan Ferraro
disse que Ibere havia desistido da Música
- o cd que estava fazendo com o o baixista Jorge Degas
foi para o espaco assim como a sua vida
interrompida pela a heróina.

O músico cearense Jaboti
nao quer mais morar no apartamento
onde Ibere desistiu da Música.

O corpo do morto espera
um papel burocrárico do Consulado em Pankov
para ser enterrado no Brasil.
...................

Mil bicicletas passaram por mim
de r e p e n t e
naquele ensolarado domingo da Skalitzerstrasse.

Katharina me disse:

- É uma Demo contra os automóveis!...
....................

No VolksBühne (teatro do povo) assisti "Frida Kahlo"de Johann Kresnik
e tomei um whisky puro no Rot Salon (salao vermelho).
O lado oriental de Berlin estava calmo
mas os pesados fantasmas da surda guerra
espreitavam nos cenários mais sombrios
(netos de Hitler patrulham os metros até de madrugada).

O pakistanes risonho veio oferecer rosas vermelhas para minhas amigas
- todas vestidas de preto como aquelas anarquistas-socialistas históricas:
Andréa estava com cabelos rosa-choque
Helena com um rico turbante senegales
Gudrun com um xalé de Pomba-gira.

Alguém muito baixinho falou nos meus ouvidos:

- Voce sabia que a Ulrike Meinhöff, do Baader-Meinhöff,
tocava muito bem violino?

...Berlin, aí de mim?

Thursday, December 15, 2005

O Soldadinho Leon


O Soldadinho Leon


Era uma vez um menino
Que queria por que queria ser
O soldadinho de chumbo
De Hans Christian Andersen
Imaginou imaginou imaginou
Imaginou tanto
Que um dia em pleno verão de Berlin
Virou um soldadinho todo prosa
Não de chumbo como queria
Mas um soldadinho de fantasia
Para desfilar no carnaval das culturas
Que por ali passava
E todo prosa saiu marchando por aí
e cantando uma musiquinha
que imitava aquele poema dos Sapos
do poeta Manuel Bandeira:

- "O soldadinho foi a guerra
Foi, não foi
Foi, não foi!"

E por toda aquela longa avenida
O soldadinho garboso
Marchou e marchou
Como ninguém.

- E foi à guerra?
Foi, não foi!

Wednesday, December 14, 2005

London Bombs


Manifestante contra a guerra no Iraque, Berlin 2003
Foto: Ras Adauto



Recebi, via e-mail numa manha dessas, o seguinte poema concreto de um dito poeta
que se assina Muhamad El Hassan que eu nao sei quem é:


London Bombs


Big-Ben
Big-Boom
Boom
Boom
Paquistan
Alah!!!!


P.S. : A mensagem tinha um vírus. Detonei!!!!

NAO ESTOU COMENDO NADA


Foto: Arquivo Nacional, Brasil

Os Negros escravos do Rio de Janeiro
comiam dos restos lancados
das mesas pelos seus petulantes Yo-yos e Yá-yás
e acreditando numa mistura milagrosa de sobrevivencia
no meio do sufoco brabo
inventaram a Feijoada Completa
- hoje Orgulho da Culinária Nacional...

Os Negros da Bahia
re-inventaram o ajeum dos Deuses Africanos - Orishás -
e vieram acorrentados nos tumbeiros
para enriquecerem os brancos escrotos
da Oropo, Franca e Bahia.

As freiras enclausuradas nos conventos
como as Carmelitas Desclacas da Chácara do Mata-Cavalo
re-criaram a "baba-de-moca", quindins,
queijadinhas, manjares e deliciosos licores
que faziam a festa dos banquetes e saraus
dos baroes, viscondes e marquesas
no tempo do Imperador.

As Negras quituteiras
regalavam os estomagos famintos
das plebes e molecólios das ruas
com seus pés-de-moleques, cuscus,
bolinhos de puba abarás
e outras mágicas misturas
com guiné, aruuda e figas
contra o mal olhado
enquanto sambavam
com seus taboleiros na cabeca

Aí, depois
vieram os fast-foods, os bobs
as speed-pizzas os macdonalds da vida
para alimentar a indústria
da fome urbana e apressada
(o cara come andando ou dentro do metro...)

Aí, uma amiga me telefonou:

- Que qui tu tá fazendo aí, Ras?...
- Nao to comendo nada, gata!...
- Vamos rangar um Sushi esperto lá no japones?...

E eu com uma puta vontade
de tracar um Baiao-de-dois
ou uma Caldeirada de Tukunaré!...

Os Soldadinhos de Madame

Sobre uma foto do Jornal “O GLOBO On Line”

do dia 7 de marco de 2003

Foto: Agencia Globo


Exército nas ruas para proteger madame

Madame toda feliz vai às compras

Protegida por seu soldadinho particular

Dá até logo para outras amigas Madames

Que também com seus soldadinhos à tira-colo

Passeiam pelo shopping e almoçam caviar chique

Longe do perigo « negro » que ameaça

A tranquilidade de Madames.


Quando chega em casa,

Madame se reune com as amigas

Para jogar biriba e dar um tequinho social

Pózinho do bom conseguido com o seu trafica particular

Um rapaz bem dotado e também massagista de Madames

que circula com seu pitbul por Ipanema e adjacencias

E à noite quebra boates e espanca homossexuais

com sua bela turminha da academia de judo


O Soldadinho de Madame fica de plantao

Lá na entrada do palacete de Madame

- Como é Maravilhóóóósa a nossa Guanabara

Diz Madame ao telefone

E finge nao ouvir os tiroteios que costumam

Costurar as noites nas Favelas

Onde mora o “perigo negro

Que Madame nao quer ver nem pintado

Em seu Carnaval...

.........................................................................

P.S.: Madame, agora temos o caveirao

Para para proteger as jóias

As propriedades

E o rico dinheirinho de Madame...

O Caveirao, agencia O Dia


- Áí, que looouuucccuuurrra, Madame!...

Suburbania



li maiakóvsky vertov pasolini
baudelaire pound goethe joyce
ginsberg dante rimbaud
faulkner shakespeare homero
erasmo virgílio cervantes
virgínia wolf doris lessing kant
malarmé bukówsky gil vicente
fernando pessoa camilo castelo branco
vitor hugo camoes agatha triste
etc etc etc etc etc etc etc etc etc etc etc
toda essa estrangeirada
quer dizer, devorei-os
juntamente com as feijoadas
os vatapás os mocotós com feijao branco
os cozidos os tustus-a-mineira
os mulatos velhos as roupas velhas
as rabadas com batatas e agriao
os pundis manjares e licores
que a minha mae Elza preparava
lá em Padre Miguel
- no subúrbio em que a gente existia.

no fundo do quintal
no pequeno quartinho
com o Gongá da família
minha irma recebia
o Exú "
Seu" Tranca-Ruas das Almas
e me mandava despachar
nas encruzilhadas abertas
das grandes horas...

Tuesday, December 13, 2005

Dark Love



Dark Love
Love Dark




lua negra
rua negra
negra nua

esperma-pérola
mancha
a Noite Dark

e o Amor
levanta a sua
Bandeira Negra

- m´ilumina
imensa
negrice

Sunday, December 11, 2005

Apresentam-se Tupa ou Sumé para suas Nacoes


Índia do Boi Caapora Doida, Berlin


Apresento-me nu e inteiro
Aos pés de Ci, a Mae do Mato
Na cabeca trago um cocar dos pásssaros
Mais belos nunca dantes vistos
Por branco nenhum com suas espingardas engatilhadas
Pintado tenho o meu corpo
Por urucum e jenipapo
Nos desenhos mais delicados
Que minhas cunhas pintaram
Com infinito carinho e prazer
Nas maos minhas armas
Que foram armas de meus antigos:
tacapé, , bodurnas, arcos e flexas
certeiros e mortais
Nas minhas palavras Raios e Trovoes
Que se arrebentam na terra.


Toda essa imensa Mata
É o meu continente
Como sao meus e de meus povos
Tudo que vive nasce, crese e e morre
E se trasforma em mata e mitos
naquela imensa Floresta
Assim como esse rio que corre
Em minhas veias e desagua além
Das possibilidades das nossas Lendas

Um rio que se precipita numa Cachoeira
E cria as racas humanas do norte
Agora vieram o Pajé e a grande Mae
de nossas Nacoes
para me saudar e fazer beber o cauim
E trouxeram os curumins e as cunhantas
Para serem iniciados na peleja da vida
E saberem dos segredos
Que habitam no ventre
Da grande Cobra que navega o Rio e o Céu…





ENGEL K


Siegesaüle, o Anjo dourado de Berlin - Foto: Ras Adauto


"Anjos sobre Berlin/
fizeram a revolucao" - Caetano Veloso

"Nao sei se era filme, realidade ou um sonho:
só sei que eram muitos anjos naquele lugar onde

eu me encontrava"

- Do meu díário, Berlin 3 de outubro de 2002.


Engel K. nao é o Anjo dourado de Win Wenders
nem o Anjo Gabriel
que apareceu para Maria na Palestina
e anunciou a geracao do Kristo-Avatar
nem é o Anjo-Exterminador
de Dom Luiz de Bunuel de Calandra
tocando seu tambor festivo para Nossa Senhora
enquanto a guarda civil espanhola
fuzilava o povo nas pracas.


Nao é o Anjo decaído LuzBelo
castigado pela ira de Javéh em Hebron
nem o Anjo Pornográfico da Itália
no circo kinográfico de Fellini
ou na perturbacao viada de Pasolini
- un anjo morto por um cruel anjo
amante antagonico e viciado -
nem é Saitan disfarsado
no belo e ruivo Anjo-da-Guarda
na Tentacao do Christo de Escorcese.


Nem é o Super Anjo
imaginado por Nietzsche
e que Hitler se apossou
para modelo de Criatura perfeita
de seu Reich de Mil anos
enquanto acariciava Eva vom Braun
entorpecida de absinto
no bunker de aco "intransponível"
da Berlin militarizada e nacional socialista.


Nein!


Nao é o Anjo das pinturas clássicas
dos museus da Europa imperial decadente e fedorenta
ou o Anjo Dark de Greenway ou de Caravaggio
ou o Anjo Kangaceiro no cordel fantástico
do Poeta nordestino
gemendo uma gesta absurda
numa feira interior de farinhas
rapaduras secas e gabirus
nem é o Anjo Aqualtirene de Palmares
que nunca se acaba em nós...


Nem é o Anjo negro e barroco de Aleijadinho
nas Almas católicas e Escravocratas
das Minas de Ouro
Escravos do Kongo e Benguela
Inquisicoes e Tribunais Reinós
das Inconfidencias gerais
que nunca se cumpriram.


Nein!


Engel K. é um Anjo passeando por Berlin
às vezes às claras
às vezes coberta por véus negros
que ocultam sua nudez de velhas culpas


E Siegessaüle, o Anjo Dourado
paira soberbo sobre a cabeca de Engel K.
E o fantasma de Rosa Luxemburg, a Vermelha
como adivinhasse minhas preocupacoes noturnas
e estrangeiras de mim
sussura no vento: "Polizei Nein! Nein!!!...


Um rápido metro corta as telas dos vídeos
enquanto a menina turca me olha
como se eu fosse um Anjo torto das aparicoes do deserto...


Ras Adauto
Poeta e Artista Multimidia
Berlin, outubro de 2002



Tuesday, December 06, 2005

O PERIGO E O AMOR


Leon, o "pensador de Kreuzberg", Berlin


O perigo está por toda parte
Por isso não se assuste. Assunte.
Se me perguntarem alguma coisa
Respondo o que me der na veneta.
Escrevo o poema e expludo na rua.
O meu amor é terrorismo puro
Sem medo
Quem acha que homem não chora
Nunca chorou ou nunca foi homem.
Nenhuma complacencia com a mentira.
A bala perdida não tem rumo certo
É como uma loteria:
qualquer um está exposto na via pública
a polícia e bandido tudo a mesma peça
ao atravessar a via não se esqueça da vida.
Assunte e atravesse
Depois é noite e os vampiros e as putas
Tomam as calçadas
Os vampiros querem seu sangue e sua alma
As putas o seu amor bandido e seu dinheiro
Voce quer matar a solidão
Cada um se alimentando da precariedade urbana do outr@
Assunte
Não existe culpado ou inocente nesse assunto
Atravesse e cumpra seu medo
O amor está no fundo
De tocaia
O amor é terrorismo puro
Contra toda abaixaria
Dessa gente hipócrita que quer mandar
No coração dos outros. Assunte.
O perigo estão por toda parte
Mora bem ali debaixo de sua escada
Na porta do prédio
Na caixa do correio

Deitada em sua cama
Comendo em sua mesa.

Expluda e depois me diga!!!

A Fome e a Fome


Foto: Ras Adauto Berlin

Ás vezes tenho fome de poemas
Aí escrevo ou entao imagino um poema
Com o qual posso matar a minha fome de poemas

Já cansei de falar da fome
Hoje todo mundo fala da fome
Até o milionário fala da fome
Como se um dia tivesse realmente fome
Qualquer político ordinário fala da fome
- A fome é uma indústria cara e milionária

Mas quem sente fome realmente
Sabe o que isso significa para a sua vida faminta
Uma crianca, por exemplo, no sinal da rua
- assustando a classe média quando passa
em seus carros com os vidros fechados -
Essa crianca quando estende as maos
Sabe que aquilo é a sua fome exposta

Às vezes tenho fome de poemas...

Um dia, na minha infancia,
Já senti fome com a minha família
E sei muito bem o que isso significa
Por isso sei que aquela crianca
Está realmente com fome
E precisa ser alimentada rapidamente

A fome nao é um discurso
Nem uma plataforma política
A fome é real e se alimenta da vida precária
A fome é o estágio anterior da morte triste
De um país que nao alimenta bem
O seu povo, assim como o Brasil.

Às vezes tenho fome de poemas
E me debruco sobre as fomes do Brasil!

A República


Foto: Ras Adauto


o brasil é
um mafuá
de Máfias

enquanto seu povo
iludido e pobre
se espreme
entre as grades
dos ricos condomínios
para assistir
deslumbrado
aos globais
se divertindo
nas áreas vips
dancando funk
cheios de segurancas
e jóias caras

- depois todo o povo
vai tomar cacete
da polícia
da governadora

o brasil é
uma república
bandida
cínica
e canibalesca

se o brasil
nao existisse
teríamos que
inventá-lo
- da lama
do caos
e da mentira política...





Monday, December 05, 2005

Poema de Dezembro


Leon e Katharina, no inverno da Grünewald, Berlin


a poesia viaja de metro

na berlin de 2 graus

te vejo passar entre brincos

e pesados capotes

penso na atriz minha amiga

que ora está no rio de janeiro

enquanto minha alma
se dissolve
num sol
que nao tenho agora

solto na europa center

e os carros já iluminam a noite

às 16 horas do inverno alemao
as luzes sao vertigens de natal

enquanto meu filho espera

sao nicolaus e seu saco imenso


no dia 7, mittwoch
completo 55 anos

e mastigo o brasil

debaixo de minha língua

ainda botocuda.


Leon vestido de inverno, em Kreuzberg, onde mora.


nacht 05.12.2005

Friday, December 02, 2005

Vaga

O Padre Pedófilo

Clodoaldo Pena Mattas




O padre Leócádio, da antiga paróquia de Nossa Senhora dos Milagres, foi fraglado com as calcas arreadas e dando um guloso boquete em um menor de 13 anos. A polícia, tendo à frente a delegada Maria do Socorro, invadiu a suite do Hotel Doces Momentos, na Estrada Velha dos Romeiros, depois várias denúncias de que o padre Leocádio era um aliciador de menores.

A polícia vinha monitorando o sacerdote há alguns meses. Descobriu-se também que o padre fazia parte de uma rede de pedofilia, com páginas na internet hospedadas em outros países. Dessa rede fazem parte também, segundo apurou nossa reportagem, juízes, advogados, políticos, policiais, taxistas e outras pessoas importantes, que estao nas listas de investigacao da delegada.

A primeira denúncia partiu de uma mae de um menor, que ultimamente era visto constantemente na paróquia e sempre aparecia em casa com dinheiro, perfumes e presentes. A mae, desconfiada, apertou o filho e este revelou que mantinha sexo com o sacerdote e que a principio os encontros eram no quarto nos fundos da igreja, onde o sacerdote tinha residencia e que depois passaram a ir a hotéis de beira de estrada.

A delegada Maria do Socorro foi juntando indícios, até que chegou a conclusao de que deveria dar o bote fatal no sacerdote.

Quando invadiram a suíte do hotel, a polícia encontrou além do menor em relacao sexual com o padre, outros 3 menores na saleta contínua ao quarto, comendo pizzas e vendo na televisao um filme porno. Aos policiais revelaram que estavam esperando a vez de "comerem" o padre. Com cada um foram encontrados cerca de 20 reais, que segundo eles, seriam o pagamento pelo "passeio".

Encaminhado à delegacia central da cidadezinha de Urubuquaquá, o padre revelou que estava prestando um servico de caridade aos menores e que tinha "uma missao evangélica" importante em sua vida. Negou terminantemente pertencer à rede de pedófilos, apesar das provas apresentadas. E disse que só responderia às questoes em juízo.

A cidade entrou numa confusao total, pois o padre Leocádio é considerado um "santo apostólico" naquela regiao. Muito duvidam do fato e acreditam que sao armacoes da oposicao política, que sempre considerou o padre Leocádio uma inoportunada figura na cidade, por seu trabalho social aos pobres e desvalidos, que sempre se chocaram com os interesses da elite local. Alguns até afirmam que quem armou a trama seriam os correligionários do Prefeito Arthur Boa Ventura, ligado à uma igreja evangélica, que está expandindo suas acoes na regiao.

Contatado por nossa reportagem, o Bispo da regiao, Dom Pedro Castanha, superior de Padre Leocádio, nao respondeu às nossas chamadas. Uma nota, lida na missa de domingo, por um padre substituto, diz entre outras coisas, que "a Igreja nao se redime de suas responsabilidades em apurar os fatos", mas acredita que "o padre Leocádio é inocente"...

Segundo investigacao da delegada Maria do Socorro, cerca de 15 menores da regiao mantiveram encontros com o padre em hotéis e na igreja.

Os menores apreendidos no hotel Doces Momentos foram encaminhados ao Instituto Nossa Senhora do Rosário para tratamento psicológico e exames de corpo-de-delitos. Serao chamados para depor no processo que foi aberto contra o padre, assim como seus pais também deverao depor. Enquanto isso, padre Leocádio está confinado em uma residencia ebiscopal e nao fala com a imprensa.

O proprietário e o gerente do Hotel também estarao incluidos no processo e nas investigacoes sobre a "rede-de-pedófilos", que age em Urubuquáquá.


O Juiz da Comarca, Dr. Carlos Ribeira, já foi notificado sobre o fato.

Fonte: O "Herege de Cunhém-nhém" - 02.12.2005

Sunday, November 27, 2005

O Gelo e os Javalis




Leon na beira do Wannsee - Fotos: Ras Adauto


Hoje, fazendo 0 (zero) grau de temperatura, fomos passear na
GrüneWald (a Floresta Verde) que contorna o Wannsee,
o grande lago de Berlin.

A Floresta com as árvores quase depenadas
estava coberta de neve e o lago já virado em gelo.
Fomos subindo o monte para contornar o lago
quando o meu faro de Oxossi presentiu algo
muito forte na área. Avisei para Katharina e Leon:

- Vem coisa!

Segundos depois, há cerca de 30 metros de nós,
em uma carreira desabalada, cerca de 30 javalis
de vários tamanhos foram subindo o monte. Eles
iam em fila indiana com os menores na frente e
o ultimo, um Grande Javali, que parecia o chefe
da manada, fechava a tropa. Esse imenso javali parou
por uns instante e ficou nos observando. Depois
seguiu em frente e sumiu no lado mais escuro
da mata.

Foi uma visao inesquecível para nós 3 ali. Nao deu
para fotografa-los pois a cena foi muito rápida, como
uma raio repentino que estoura no céu. Por vários
instantes ficou no ar o cheiro deles, como se fosse
o cheiro de um chiqueiro de porcos.

Foi uma das cenas mais incríveis que já vi na minha vida.
Um poema inteiro da natureza se manifestando ali
na nossa frente

Berlin, 27.11.2005

Saturday, November 26, 2005

Tambor de Crioula


ModevonOumouSy11, OumouSy


Fui ao Agbara-Dudu
ve-la dancar

Nessa noite
ela estava ainda mais linda
seus búzios
suas trancas
seu abébé
suas palhas-mariwo
negra negra negra

Pensei com os meus botoes:
será a Rainha Nzinga?
será a Rainha Sheba de Adis-Abeba?
será a Matamba de Cacurucaia?
será a Rianha Elefanta do Congoß
ou a Princesa Guerreira de Axum?

Num momento qualquer
i m p e r c e p i t í v e l
que só o olhar contaminado
pode perceber
ela
flutuou
no terreiro
respondendo aos tambores
que se anunciavam.

Madureira flutuou
dentro de mim, ai!

Ela era como
um bronze de Benin!

Rio de Janeiro, 1989


OusmouSyportrait1, OusmouSy

Entrevista para o K36 Kreuzberg News - Continuando...

continuando...

- Voce acredita em Deus ?

- Deus para mim é uma icógnita. Eu acredito em muitos deuses e deusas. Sou um panteista e um ecumenico. Meu orixá
é Logun-Édé, por sinal o orixá artista, assim como Oxumaré, a Boa. Eu fui criado dentro do catolicismo até determinada idade, beijava mao de padre, ia à igreja me confessar e comungar, assistia aqueles filmes da "Vida de Cristo" todas as sextas-feiras da Paixao. Aí um dia todas as mulheres da minha casa, minha mae e minhas irmas, bolaram no Santo. Comecou a aparecer Ogun. Yemanjá, Oxossi, Seu Cobra Coral, Exú Tiriri, etc. Essas entidades tomaram a minha casa
e entre imagens de Nossas Senhoras e Coracoes de Jesus, Sao Jorge matando o Dragao, Santas Claras, essas energias, o nosso lado africano, pediram passagem debaixo daquele esconderijo de cruzes e ladainhas e ficaram.

Li muito também sobre religioes orientais: budismo, hinduismo, lamaismo, etc. Eu gosto, só nao suporto mais essa visao catequética da humanidade, seja do catolicismo, judaismo, islamismo, evangélica... Todo muito deve professar a religiao que mais lhe couber no coracao e na alma, mas só nao pode achar que a sua religiao é a única e vrdadeira, que está acima das outras. Por isso nao gosto de Papas e pastores. Como poderia citar o Buda: o buda é voce mesmo, cada um é seu próprio buda... Como cada um de nós, como ensina a cosmologia do ser dos yorubas, cada um de nós carrega seu próprio Exú dentro de si e seu Ori...

Entao Deus pra mim é um coquetel disso tudo e ele pode estar agora, misturado à minha saliva, embaixo de minha língua. Gosto muito daquela tirada do genio do cinema espanhol, Luis Bunuel, quando lhe perguntaram que religiao ele era: "Sou ateu, gracas a Deus", respondeu com ironia à reporter.

- Recita alguma coisa aí pra nós para terminarmos a entrevista:

- Cada palavra carrega um segredo
mas é entre o silencio entre uma palavra e outra
é que se pronuncia a música
ou uma terrível revelacao
ou se quiserem é onde habita o nada
na verdade nao existe esse silencio
como sempre relatou o músico John Cage
pois é justamente ali no meio daquele silencio
que nasceu a primeira palavra da humanidade
que para os Egípicios antigos era o grito de Osiris
"RA!!!"
ou o "OM" de Shiva
a palavra-flauta de Tupa
o estrondo de Thor dos Vinking
ou o grito do Orixá quando dá o seu nome
num ritual de iniciacao de uma yao

Por isso que uma palavra nao deve
ser dita a toa...

Entrevista: Andreas Dick
Entrevistado: Ras Adauto

Berlin, 26.11.2005

Entrevista para o K36 Kreuzberg News


Dando uma de índio "Tupitáputo", no filme "O RIO",
de Marcelo Serra...


Ras Adauto e Leon Oranian, no Karneval der Kulturen,
Berlin junho de 2005 - Foto: Katharina La Henges


- Ras Adauto é seu nome?

- Nao, isso é um nome artístico, um nickname... O meu nome mesmo é Adauto de Souza Santos. Ras Adauto adquiri dentro do movimento rastafari no Rio de Janeiro...do qual sou um dos agitadores.

- Voce nasceu aonde?

- Nasci no Rio de Janeiro, na comunidade favelada do Andaraí. Sou de origem baiana, carioca, indígena, portuguesa; aquele caldo grosso brasileiro, aquele tempero, entre a senzala e os terreiros, a casa grande e as florestas selvagens do Brasil...

- Voce trabalha com várias mídias, com várias artes (cinema, video, literatura, teatro, música, fotografia, etc). Como é isso pra voce? É uma inquietacao que voce tem... ou?

- Eu sempre gostei de artes. Essa coisa de ser artista, de inventar coisas mágicas, pensar que eu sou outra pessoa, um personagem de ficcao... Minha primeira grande paixao foi a literatura, desde pequeno a literatura fez parte da minha formacao. Meu pai, um operário da indústria textil, semi analfabeto, me ensinou a ler aos 3 anos de idade e foi ele quem me deu o primeiro livro. Apartir daí comecei a ler tudo que caia na minha mao. Nao foi atoa que entrei para a Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro para estudar Literaturas. Posso dizer que da Literatura Brasileira li praticamente tudo, dos clássicos aos modernos. A minha mae ficava preocupada comigo e dizia que ei ficar maluco de tanto ler. Mas na verdade eu já estava doido há muito tempo, pois a literatura, seus personagens, cenas e situacoes foram as chaves fundamentais para as outras artes e para meu processo de criacao e fantasia. Adoro fantasiar as coisas, imaginar situacoes absurdas, impasse ficcionais, poéticas, dramas... tudo isso. Por isso adoro o universo infantil, onde habitam os seres fantásticos, os sacis pereres, os gnomos, as fadas, o outro lado do espelho das alices de todas as culturas, dos irmaos grimm à monteiro lobato... Adoro criar coisas com o meu filho Leon, que tem uma imaginacao que nao está no gibi...

O teatro veio quando em 1979 fui para o Teatro Oficina de Sao Paulo, aí me desenvolvi como ator, um farsante, o mascarado, o dissimulador. Pois foi no Teatro Oficina, com os treinamentos radicais de José Celso Martinez Correia o maior diretor do teatro moderno brasileiro, que penetrei nesse patamar complexo da esquizofrenia humana e da dissimulacao artística, entre o ridículo e a caretice humana e a celebracao da tragédia e da comédia...

.A música, que acompanha todo mundo desde que nasce, veio no processso e apesar de nao ser um músico, já cometi uma série de composicoes e sempre tive ligacoes fortes com músicos, cantoras, no Brasil e agora aqui em Berlin. Acho a música a arte universal por excelencia, a mais anti-racista, a que mais penetra na consciencia humana. Agora, gosto de boa música, nao essa enxurrada de bobagens ridículas que está rolando por aí. Gosto de ouvir todo tipo de música: clássica, hip-hop, blues, jazz, reggae, música indú música árabe, indígena, batuques, etc É a comunicacao mais avancada da humanidade pra mim... E o meu país tem uma das músicas mais ricas do mundo e os brasileiros sao altamente musicais.

Aí depois na sequencia foram entrando o cinema, o video, a fotografia...Adoro a questao mágica da imagem em movimento. Da ciencia da película cinematográfica, extensao da fotografia; e agora a tecnologia digital. E também da projecao dessa imagem para criar uma atmosfera de uma outra dimensao, uma humanidade paralela que se movimenta num filme, num documentário...É fascinante!

- Voce acredita que o artista é um ser especial?

- Eu acho que nao... O artista é um ser humano como qualquer um... Mas o que ele traz de diferente é a possibilidade de criar coisas que nao existem para entreter e fazer sonhar as outras pessoas, como Chaplin, Picasso, Glauber Rocha e tantos e tantas outras fizeram e fazem. Hoje com essa ridícula sociedade de espetáculos voltamos àquela visao do artista inatingível em sua torre de marfin de segurancas, guarda-costas, etc., que o resto dos mortais tem que ficar adorando enquanto eles se apresentam em seus palcos ilumindados e caros. E quando esses tais artistas se apresentam é a merda que se ve, a mediocridade toda. Um verdadeiro artista é o ser humano que tem como funcao elevar a qualidade imaginativa do inconsciente da humanidade, por isso ele é um rebelde permanente contra a mediocridade das cenas desses falsos espetáculos...

- Voce gosta de política?

- Eu gosto de política social, no sentido mais amplo. Nao tenho muito paciencia para políticos, principalmente no meu país, com toda aquela mediocridade absurda ainda originária dos tempos da colonia, onde se exterminavam nacoes indigenas e escravizavam negros africanos para enriquecer as poucas famílias senhoriais. Isso ainda continua, mas tem muita gente lutando há anos contra isso, contra esse cancro no Brasil. E digo mais, o Brasil é um dos piores países racistas do mundo atualmente. E isso vem lá de cima e atinge toda uma sociedade crítica...que ainda nao resolveu o seu principal problema de identidade real e nao fictícia... Esse é um romance, a novela que eu nao gosto. Como diria um poeta famoso brasileiro, o modernista Oswald de Andrade: "O Brasil é o único país do mundo, que a elite é estrangeira e o povo brasileiro"... É mais ou menos por aí... Essa elite brasileira sonha em ser "europeu" ou "americana" e nao ve que a própria Europa e os Estados Unidos estao numa puta crise de sua identidade multicultural e multiracial... Acredito eu que esses lances sao os grandes temas para o próximo milenio, nao sao só as guerra religiosas ou os tais terrorismos que estamos assistindo e participando hoje em dia. O mundo todo está passando por uma longa crise de identidade e de identificacao, e o meu país ainda está pensando com a cabeca da Casa Grande e das Senzalas, no século XIX... O que que somos? Nós somos tudo isso e ainda temos que fazer parte da grande movimentacao global do mundo.

- A sua arte é política?

- No sentido amplo, sim. Qualquer acao artística pode ser considerada política, pois o ser humano é um ser da polis. Agora: eu nao gosto da arte dirigida, desse tipo de arte catequética, que voce tem que fazer a cabeca das pessoas. Ou que voce por ser negro, índio, turco, etc e tal, voce TEM que fazer arte sobre aquilo. Evidentemente se voce é um negro, voce diretamente, quase que inconscientemente, voce vai retratar o seu universo, contar seus dramas, conflitos, a partir de onde voce veio... Mas acredito que um artista verdadeiro ele deve ampliar as suas possibilidades e falar de qualquer coisa sem limitacoes ideológicas ou imposicoes catequéticas. Eu nao preciso mais, hoje em dia, ficar repetindo pra todo mundo que eu sou um negro. Eu sou um Negro e pronto. E as minhas artes partem disso... Essa é a minha base universal, ser Negro, para falar com todas as línguas e sentidos para a humanidade toda. Nao quero ficar reduzido a um gueto que me coloquem. Por isso o personagem que eu mais gosto e me guio é o Orixá Exú, figura central do Panteon da religiao afro-brasileira de origem Yorubá. Exú se movimenta em todas, está em todos os caminhos, fala todas as linguagens, é o grande artista dos mil instrumentos, toca flauta e chupa cana ao mesmo tempo... Exú nao cai nesse papo de guetos e artes reduzidas, e é sempre o Exú, o que tem mais de mil nomes... Exú é o rei das Artemanhas!

- E aqui em Berlin, voce faz o que?

- Em Berlin faco parte de uma comunidade de artistas de várias nacionalidades e áreas de atuacao. No Brasil eu também fazia parte de uma comunidade assim, mas só que aqui acontece uma extensao, pois nao temos só brasileiros ou brasileiras, entendeu? Berlin é muitiracial internacional. Faco parte de uma associacao chamada Nijinski Arts Internacional e.V.-Berlin. E desenvolvo o meu trabalho junto com minha grande parceira e amiga, Katharina la Henges. E nós estamos agora introduzindo o nosso filho Leon Oranian, de 6 anos, na nossa banda de teimosos sonhadores imaginativos. Na verdade na verdade, eu sou um macumbeiro, o que eu faco é macumba, minha arte é a minha macumba. O grande poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade escreveu que: "A poesia é a minha cachaca". Eu escrevo: "a poesia é a minha Macumba". Antes eu fazia macumba nas encruzilhadas do Rio de Janeiro, hoje faco macumba no meio do mundo aqui em Berlin... Quero ser cada vez mais um ser universal, debaixo de minha pele negra, a minha melhor arte!...

Entrevista: Andreas Dick
Entrevistado: Ras Adauto

Friday, November 25, 2005

ReToQuE






TOQUE ME TOQUE SE TOQUE RE TOQUE!

Os Orixás vivem num mundo virtual!

E se Deus existe mesmo
Que ele apareca aqui na
minha frente agora
e me toque um Blues
e me de um beijo de língua
Porque nao sou como Nijinski
o Palhaco de Deus

Outro dia me falaram
que Deus mora nas pregas

Mas como diz o Hino nacional do Iraque:
"Esta Terra é uma mistura
de Chama e Luz..."

Deus é uma das muitas possibilidades
que podem ser retocadas
Se Toque!

O Menino Fotográfico



O poeta viaja de metro
em Berlin
enquanto seu filho
lhe toma uma fotografia

O menino diz para o pai:

"Papi, bleib hier;
Sehe mal der vogel!"
(Papi, fica aí:
Olha o passarinho!)

Flaaaassshhhh!!!!
faz a pequena maquininha do menino.

O poeta entao se lembra
de Joao Gilberto
e canta bem desafinado
para o menino fotográfico:

"Fotografei voce
na minha Digital
revelou-se-me
a sua e n o r m e
gratidao!"

Mas o metro U7 de Berlin
indiferente à cena
segue decidido
em direcao
à Alexenderplatz...

Thursday, November 24, 2005

O Anjo da Esphinge


Leon posa no muro grafitado pelos
jovens turcos do K-36 em Berlin



A Cidade está nervosa
Meu Coracao está em chamas como Paris
A Polícia nao me ve
Porque estou invisível
Só o meu Amor
Me decifra e me devora

A Cidade está nervosa!

EU, RIO


















Anjo da Parada Gay, em Berlin 2002



o leopardo
ruge
na floresta

o mago
evapora-se
na megacidade

o hiper-satélite
espia
para o comando secreto

a modelo
se abre
ao diretor de tv

a polícia
vigia
os "pretos suspeitos"

muita coca
gafungada por
narizes bacanas

eu aprecio
as modas
e me aguardo

o pivete
cheira cola
e delira na rua

o americano babaca
é abatido
em copacabana

"a mondian
também se chega
pelo acougue" (W.S.)

os loucos d´engenho di dentro
falam com deus
via dra. nise: cambio!

a passarela
era toda
da porta-bandeira

escondeu a bandeira
debaixo do
maior rai-ban

o artista morreu de aids
e virou
santo na hora

fugiu da mansao
pra dancar
no baile funk do morro

fui!... porque
o bicho pegou
na central do brasil

Quindim da Central


baiana Damiana, Tangará Tanz, 2005

"como uma música de Carlinhos Brown"


bicicleta
na AlfaOmega
da Muqueca
da Baiana do Quindim

white mouse
do UniBomber
na catraca
da Central do Brasil

pega na Kalunga
do Piauí
brabo na Viola
do seu Legbará

moca turca
lá de Berlin
diga que Kreuzberg
vira Stambul

moca Damiana
do Tangará
leva o tabuleiro
para o seu Obá

Tuesday, November 22, 2005

O Poema no Asfalto e no Espelho



O menino procura
o seu poema-imagem
no espelho
e satisfeito sorri
para si mesmo
confiante
na sua poética
infantil e mágica
















Leon desenha
o seu poema
no asfalto

Na Berlin Histórica



Curiosas
elas me observam
por trás da vitrine
da Berlin Histórica
em suas sinas de
Bonecas antigas





No mesmo local histórico
onde Berlin nasceu

há séculos e séculos e séculos atrás
A estátua grega danca ao vento

para mim fotografá-la




Cuba e Soweto
se encontram
de repente
em Berlin

- Ai de mim!...




Em Berlin-Mitte
pego o Träm de Falkenberg

Mas nao chego
ao Paraíso...

Arte Ocidental III - Carlitos


Carlitos, Goeldi


Estou só com os meus botoes
e de repente nos resquícios de minha memória
nao sei de onde nem porque
me aparece a imagem de Carlitos
entre as engrenagens
da Grande Máquina Industrial
do meu pensamento

E eu como uma Santa Clara
projeto Carlitos
na parede branca do meu quarto
enquanto a chuva
(orquestrando lá fora)
sonoriza o espetáculo

A madrugada de meu sábado de Aleluia
em pleno 1993
é cinemathographica & muda
- um anjo antigo e engracado
saiu das trevas
e veio à luz
para falar comigo

Repentinamente
como se nada esperasse de nada
Carlitos foge em desabalada carreira
nao sei pra onde
perseguido
por um guarda furioso e bigodudo
balancando um cacetete
maior que a cidade inteira

A crianca de mim
cai na gargalhada
e se mija toda
de tanto rir!