Monday, December 19, 2005

"O Branco e o Índio"


A Poeta Elisa Lucinda e Ras Adauto, no filme
"O RIO", de Marcelo Serra



O índio Sebastiao de Oxossi Tupinambá
Foto: Katharina la Henges

"Aicué curí uiocó, paraná-assú sui, peruaiana, quirimbaua piri pessuí
[Vai aparecer do rio maior, o maior e mais poderoso inimigo de vocês].
Foi com essa mensagem que Ponaminari, o grande mensageiro de Tupana, tentou prevenir todos os povos que dominavam estas terras antes de 1500.
Talvez os pajés e os chefes imaginassem que este poderoso inimigo fosse uma epidemia, ou a ira dos ventos, revolta das matas, ou mesmo vingança de Curupira.
Mas em nenhum momento eles imaginaram que o inimigo seria o homem branco, vindo do meio do mar, conforme testemunharam os olhares Tupiniquim, Tupinambá e quem sabe outros povos nativos da costa Atlântica.
Muitos anos depois, essa mesma história se repetiria nas terras dos valentes Xavante, Kaiapó, Juruna e Kayabi no Centro-Oeste, entre os Tarumã, Baré e Manao, na confluência dos rios Negro e Solimões, e entre os Tukano, Baniwa, Desana e outros no extremo norte, no alto rio Negro."

Baré Braz de Oliveira Franca - Rio Negro

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A epopéia indígena segundo Ras Adauto

Ele vieram das imensas águas em grandes pássaros de vento
Muito brancos e barbudos,
tinham armas que cospiam fogo
e ferros que cortavam as carnes e as árvores.
Também trouxeram os Paí
com imensas cruzes e rosários
e nos benziam dizendo
que éramos filhos de um Deus
que a gente nem sabia o que era.

Dormiram com as nossas mulheres
tomaram as nossas terras
incendiaram nossas aldeias
escravizaram nossos parentes
mataram as nossas criancas
e disseram que ali era tudo deles:
tudo Portugal e de El-Rey
que a gente nem sabia o que era...
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O TUPINAMBÁ


"Ali vem a nossa comida pulando" -
Oswald de Andrade, Poesia Pau Brasil


Veio um sordado barbudo
Coberto de armaduras
lancas brilhantes e estandartes
que era uma beleza!
- aí, a gente comemos ele!…

Veio um Donatário
Todo emproado
Cheio de medalhas e honrarias
E uma imensa capa de veludo vermelho
- aí, a gente comemos ele!…

Veio um padre
Com uma enorme cruz
E quis botar a mao
Nas nossas cabecas
- aí, a gente comemos ele!…

Veio uma esquadra
Maior que um maloca
Com armas poderosas
Cuspindo fogo como um trovao
- aí, a gente corremos mato adentro!…
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Aí a gente dormiu
Só Cunhambepe ficou acordado naquela noite
E Cunhambepe nao era de ficar alerta atoa
Quando eles vieram em suas canoas ligeiras
e tentaram aportar em Urucu-mirim
Cunhambepe deu o alerta
Aí nos respondemos ao fogo cruzado
Com as nossas flechas relampagos
e a Baia de Guanabara ficou tinta de sangue
naquele dia
E Cunhambepe nao era de ficar nervoso atoa...
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Ói, Parente
É vem a nosso comida ali pulando
Deve dar um moquém delicioso
Pra gente comer com beijú e Caium

Depois vamos brincar com as Cunhas
na redes de fazer mais curumins e cunhantas
e povoar tudo de novo por aqui...
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Aí o Paí levantando a imensa cruz
mandou que todos nós nos ajoelhassemos
Jaguareque nao se ajoelhou
E o Paí falou que Jaguareque era o Demonio...
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Ajuricaba virava tudo que era bicho na mata
Eles custaram a matar Ajuricaba
Quando Ajuricaba foi morto
Virou assombracao para assombrar a Vila deles
Ajuricaba assobiava no vento
Virava raio e trovoes e insetos venenosos
Virou anaconda e comeu muito deles
Eles nunca mais esqueceram Ajuricaba
que habitou até os sonhos deles...
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500 Anos depois:

- E aí, Índio?!
- Índio, nao!!... Caboclo!!!
Tenha mais respeito comigo...

- E aí, Bugre?!
- Bugre, nao!!!... ÍNDIO!!!
Tenha mais respeito comigo...

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