
Poema de Lúcio Congo, 90 anos:
"Casa de mulato, terreiro de negro,
toda a fazenda e as terras de branco.
Cade, Tumbajuçara?:
- Tá na mataria!"
A Arte poética e digital de um poeta no estrangeiro: "queria re-construir um castelo de palavras/mesmo vindo de um barraco/mas preferiu incendiar as indiferencas e reacender o amor no meio do mundo/sem nenhum remorso ou dor maior do que aquela de sua própria vida..." - Ras Adauto
Um dia o meu amor
Fugiu de entre meus dedos
Como um passarinho
Ontem recebi um e-mail seu:
Amor, estou em Paris
Feliz da vida
Com a minha intensa solidão
Espero que estejas bem
E não deixe de alimentar
O papagaio Oswald
E o meu cachorrinho Veludo
Não sei quando volto
Ou se volto
Beijos
Sai na noite e fui
A um bordel
Onde afoguei as minhas máguas
Numa carne viciada
E profunda como um mar
Um pianista cocaínomano
Tocava uma música brega
Tentando alegrar
Aquelas solidões absurdas
Que agonizam ali
Entre copos de conhaque e whiski baratos
Carreiras de pó
Mortes lentas e desenganos
Senti-me um anjo negro naquela noite milagrosa
Na madrugada de insônia e paranóias
Mandei um e-mail ao meu amor fugido:
Amor, morri! Meu enterro é daqui a pouco
Não me mande flores nem ladainhas
Até já!!!!
O silencio, então,
Tocou a sua sinfonia.
De arroz com ovo frito
O trem lotado e o funk na ponta da língua
Mas não sou avião à toa
Na laje lá de casa
Meninos soltam pipas
E lá no Brasil da Central
O camelo-avião corre azuado
Dos cavalos corredores
Vestidos de preto
E crachás onde os nomes
ninguém consegue ler.
Ras Adauto
***********************

Cacaso foi um grande poeta e amigo que encontrei através da Heloisa Buarque de Hollanda. Na época, 1974, eu era aluno da Heloisa na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que ficava ali na Rua Chile s/n. Nós faziamos parte do dito "Movimento da Poesia Marginal", que foi muito polemico na época. Desse movimento surgiram figuras famosas como Chacal, Charles, Bernardo Villena, Chico Chaves, Ronaldo Santos, entre outros/as. Esse movimento culminou na publicacao da famosa e muito criticada antologia poética "26 Poetas Hoje", que Heloisa editou para uma editora Espanhola que se instalava no Rio de Janeiro em 1975. Sendo o primeiro livro de estréia dessa editora. A antologia 26 Poetas Hoje- marcou época ao apresentar a poesia marginal, trazendo, em plena vigência da censura, o testemunho da geração AI5 e sua dicção coloquial, irreverente e bem humorada. Uma obra clássica para os interessados em poesia contemporânea, agora revista e já em terceira edição. Participam desta edição Ana Cristina César, Cacaso, Torquato Neto, Chico Alvim, Geraldo Carneiro, Waly Salomão, Chacal, Bernardo Vilhena, Capinan, Adauto, entre outros. - Ras Adauto BerlinNão há
no mundo nada
mais bem
distribuído do que a
razão: até quem não tem tem
um pouquinho
Fatalidade
A mulher madura viceja
nos seios de treze anos de certa menina morena.
Amantes fidelíssimos se matarão em duelo
crepúsculos desfilarão em posição de sentido
o sol será destronado e durante séculos violas plangentes
farão assembléias de emergência.
Tudo isso já vejo nuns seios arrebitados
de primeira comunhão.
Lar doce lar
(para Maurício Maestro)
Minha pátria é minha infância:
por isso vivo no exílio
| |||||||
"O poeta Charles, em artigo publicado no Jornal do Brasil, em 1986, disse que a “literatura marginal” escrita nos anos 70 está balizada por duas mortes: a de Torquato Neto (“e vivo tranqüilamente todas as horas do fim”), que marca o melancólico início, e a de Ana Cristina César (“Estou muito concentrada no meu pânico”), que chama a atenção para o gran finale de sua geração.
Nos anos de chumbo, período da ditadura militar instaurada a partir de 1964, surgiu uma geração de poetas que ficou conhecida pelo nome de “geração mimeógrafo” ou “geração marginal.” Geração mimeógrafo pela característica de produzir suas obras: edições independentes, de baixo custo, comercializado em circuitos alternativos, gerada de mão em mãos – particularmente em bares e universidades. Nesse contexto de ditadura e desbunde é que surgiu o poeta Cacaso.
Antonio Carlos de Brito, ou Cacaso, nasceu em 13 de março de 1944, Uberaba (MG), professor universitário, letrista e poeta. Depois de viver no interior de São Paulo, mudou-se aos onze anos para o Rio de Janeiro, onde estudou Filosofia e, na década de 1970, lecionou Teoria da Literatura e Literatura Brasileira na PUC-RJ. Foi colaborador regular de revistas e jornais, como Opinião e Movimento, tendo, entre outros assuntos, defendido e teorizado acerca do cenário poético de seus contemporâneos, a geração mimeógrafo, criadores da dita poesia marginal, que ganhou publicidade com a antologia 26 Poetas Hoje, organizada por Heloisa Buarque de Holanda."
- Cacaso um Marginal Transgressor
Gilfrancisco Santos
Jornalista, pesquisador e professor universitário.
http://www.revistaetcetera.com.br/21/cacaso_gil/index.html
______________
Domingo, 11 Janeiro, 2009
De todas as notícias que dei na última edição impressa da coluna Estúdio, na sexta-feira 9, a que mais me deixou feliz foi a produção de um disco em tributo a Cacaso (1944 - 1987), que, além de poeta e magnífico letrista de MPB, vem a ser também o pai de Pedro Landim, colega do jornal O DIA. Sempre curti a poesia cortante e concisa de Cacaso, letrista de músicas como Amor Amor e Face a Face, gravadas por Maria Bethânia e Simone nos anos 70, respectivamente. O CD, idealizado e produzido por Heron Coelho de seu próprio bolso para reavivar a obra musical de Cacaso, já está em fase final de gravação e sai este ano. Duas gravadoras, Biscoito Fino e Lua Music, já estão no páreo para ter o privilégio de editar o CD Cacaso - Letra e Música. O time de músicos e cantores envolvidos no disco é de primeira e inclui alguns parceiros de Cacaso como Francis Hime, Sueli Costa, Zé Renato e João Donato. Eis a lista de músicas, autores e intérpretes deste álbum muito bem-vindo:


