
Poema de Lúcio Congo, 90 anos:
"Casa de mulato, terreiro de negro,
toda a fazenda e as terras de branco.
Cade, Tumbajuçara?:
- Tá na mataria!"
A Arte poética e digital de um poeta no estrangeiro: "queria re-construir um castelo de palavras/mesmo vindo de um barraco/mas preferiu incendiar as indiferencas e reacender o amor no meio do mundo/sem nenhum remorso ou dor maior do que aquela de sua própria vida..." - Ras Adauto
Um dia o meu amor
Fugiu de entre meus dedos
Como um passarinho
Ontem recebi um e-mail seu:
Amor, estou em Paris
Feliz da vida
Com a minha intensa solidão
Espero que estejas bem
E não deixe de alimentar
O papagaio Oswald
E o meu cachorrinho Veludo
Não sei quando volto
Ou se volto
Beijos
Sai na noite e fui
A um bordel
Onde afoguei as minhas máguas
Numa carne viciada
E profunda como um mar
Um pianista cocaínomano
Tocava uma música brega
Tentando alegrar
Aquelas solidões absurdas
Que agonizam ali
Entre copos de conhaque e whiski baratos
Carreiras de pó
Mortes lentas e desenganos
Senti-me um anjo negro naquela noite milagrosa
Na madrugada de insônia e paranóias
Mandei um e-mail ao meu amor fugido:
Amor, morri! Meu enterro é daqui a pouco
Não me mande flores nem ladainhas
Até já!!!!
O silencio, então,
Tocou a sua sinfonia.
De arroz com ovo frito
O trem lotado e o funk na ponta da língua
Mas não sou avião à toa
Na laje lá de casa
Meninos soltam pipas
E lá no Brasil da Central
O camelo-avião corre azuado
Dos cavalos corredores
Vestidos de preto
E crachás onde os nomes
ninguém consegue ler.
Ras Adauto
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Não há
no mundo nada
mais bem
distribuído do que a
razão: até quem não tem tem
um pouquinho
Fatalidade
A mulher madura viceja
nos seios de treze anos de certa menina morena.
Amantes fidelíssimos se matarão em duelo
crepúsculos desfilarão em posição de sentido
o sol será destronado e durante séculos violas plangentes
farão assembléias de emergência.
Tudo isso já vejo nuns seios arrebitados
de primeira comunhão.
Lar doce lar
(para Maurício Maestro)
Minha pátria é minha infância:
por isso vivo no exílio
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"O poeta Charles, em artigo publicado no Jornal do Brasil, em 1986, disse que a “literatura marginal” escrita nos anos 70 está balizada por duas mortes: a de Torquato Neto (“e vivo tranqüilamente todas as horas do fim”), que marca o melancólico início, e a de Ana Cristina César (“Estou muito concentrada no meu pânico”), que chama a atenção para o gran finale de sua geração.
Nos anos de chumbo, período da ditadura militar instaurada a partir de 1964, surgiu uma geração de poetas que ficou conhecida pelo nome de “geração mimeógrafo” ou “geração marginal.” Geração mimeógrafo pela característica de produzir suas obras: edições independentes, de baixo custo, comercializado em circuitos alternativos, gerada de mão em mãos – particularmente em bares e universidades. Nesse contexto de ditadura e desbunde é que surgiu o poeta Cacaso.
Antonio Carlos de Brito, ou Cacaso, nasceu em 13 de março de 1944, Uberaba (MG), professor universitário, letrista e poeta. Depois de viver no interior de São Paulo, mudou-se aos onze anos para o Rio de Janeiro, onde estudou Filosofia e, na década de 1970, lecionou Teoria da Literatura e Literatura Brasileira na PUC-RJ. Foi colaborador regular de revistas e jornais, como Opinião e Movimento, tendo, entre outros assuntos, defendido e teorizado acerca do cenário poético de seus contemporâneos, a geração mimeógrafo, criadores da dita poesia marginal, que ganhou publicidade com a antologia 26 Poetas Hoje, organizada por Heloisa Buarque de Holanda."
- Cacaso um Marginal Transgressor
Gilfrancisco Santos
Jornalista, pesquisador e professor universitário.
http://www.revistaetcetera.com.br/21/cacaso_gil/index.html
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Domingo, 11 Janeiro, 2009
De todas as notícias que dei na última edição impressa da coluna Estúdio, na sexta-feira 9, a que mais me deixou feliz foi a produção de um disco em tributo a Cacaso (1944 - 1987), que, além de poeta e magnífico letrista de MPB, vem a ser também o pai de Pedro Landim, colega do jornal O DIA. Sempre curti a poesia cortante e concisa de Cacaso, letrista de músicas como Amor Amor e Face a Face, gravadas por Maria Bethânia e Simone nos anos 70, respectivamente. O CD, idealizado e produzido por Heron Coelho de seu próprio bolso para reavivar a obra musical de Cacaso, já está em fase final de gravação e sai este ano. Duas gravadoras, Biscoito Fino e Lua Music, já estão no páreo para ter o privilégio de editar o CD Cacaso - Letra e Música. O time de músicos e cantores envolvidos no disco é de primeira e inclui alguns parceiros de Cacaso como Francis Hime, Sueli Costa, Zé Renato e João Donato. Eis a lista de músicas, autores e intérpretes deste álbum muito bem-vindo: